Monday 28 March 2011

Frases #1

«Nós nascemos para cooperar, como pés, como mãos, como pálpebras, como os dentes de cima e de baixo. Portanto trabalhar em oposição uns aos outros é contra a natureza: e raiva ou rejeição são oposições»

Marco Aurélio, Meditações

Wednesday 23 March 2011

Uma Teoria Tecno-Evolucionária



Nesse vídeo, Amber Case menciona muitas coisas, algumas das quais me encontro em completo acordo; em outras, discordo completamente. Nos tornamos ciborgues? Se não, devemos estar bem perto disso. Em minhas leituras de McKenna e Morrison, passando pela mente bicameral de Julian Jaynes, venho pensando numa teoria onde algumas de suas idéias acabem por convergir.

Amber case se refere à internet no final do vídeo como parecendo algo mais orgânico do que tecnológico. Aqui me parece residir um erro. Falamos sempre de tecnologia como algo criado pelo homem; mas se a natureza cria os organismos, não podemos falar também desses como tecnologia? Talvez lhes devamos dar um novo nome, como organotecnologia.

Mas o problema principal da palestra de Amber Case reside no fato de ela caminhar no caminho do medo e paranóia das novas tecnologias. Isso me parece assustador, quando seres supostamente inteligentes vêem a mudança tecnológica como algo de mau. Ela se encontra realmente preocupada com o fato de nos encontrarmos perdendo défices de atenção e portanto nos tornando menos conscientes devido ao uso da internet.

Da mesma forma que Sócrates falou contra os livros porque pensava que os seres humanos ficariam menos inteligentes - pena que ele não contou com Gutenberg. A tecnologia nos separa dos animais. Através de nossa criação tecnológica, ultrapassamos nossas barreiras biológicas.

Os homens das cavernas viveram nelas talvez porque as condições meteorológicas não lhes eram favoráveis. Mas depois ele usou peles de animais e criou roupas; cortou árvores e fez casas; e assim levou a caverna consigo para todo o lado - a tecnologia o fez ultrapassar essa barreira biológica. O homem manufatura. Faz coisas para que assim possa sobreviver. Mas nunca sem um propósito.

Depois de Jaynes, VALIS e Morrison, venho pensando que aquilo que temos como consciência comum não passa de uma ilusão. Talvez nós pensamos que "existimos". A ilusão não reside em pensarmos que existimos, mas na assunção que "somos" indivíduos. Se Jaynes estiver certo, e a consciência não passar de uma coisa cultural em vez de evolucionária, então a individualidade faz parte dessa ilusão; se pegarmos na teoria de Grant Morrison de que "somos" seções através do tempo, partes de um todo, ramos da mesma árvore humana (que nunca vêem toda a árvore e portanto acham que apenas eles existem), então de novo a individualidade ganha força como se tratando de uma ilusão. Uma mentira. Nossos sentidos nos mentem em pensarmos que "somos" separados, individuais.

A consciência nos faz viver dentro de nossas cabeças em vez de fora delas. E porque pensamos que vivemos no interior, julgamos que existe algo chamado o "lá fora", o "exterior", o "estrangeiro". E essa se trata de uma outra ilusão ainda - essa bem mais perigosa - de que vivemos fora da natureza. E voltando a Morrison, bem, a natureza inclui tudo. Carros, edifícios, microondas, bomba atômica, garfos, roupas, tudo.

A criação humana não passa de biologia tecnologicamente modificada - mas não podemos deixar de lhe chamar natureza. E agora se voltarmos a Terence McKenna e a sua teoria de que a natureza nos usa para se transformar, chego num ponto em que começo a duvidar desse fenômeno chamado "poluição". Porque se a natureza pretende que nós a alteremos, essa coisa de poluição não existe. A chamamos de poluição porque estamos danificando o habitat de certos organismos biológicos, que dependem de oxigênio para viver.

Mas como provam as recentes descobertas da NASA, talvez nem todos os organismos precisem de oxigênio para viver. As árvores, por exemplo, respiram dióxido de carbono. Chamamos esse fenômeno de poluição porque não o entendemos. E se estivermos de fato mudando o mundo através dessa chamada "poluição"? E se o novo mundo que criarmos for um mundo em que nós mesmos teremos de ser recriados?

Se a teoria de McKenna de que a natureza através da inteligência artificial quer que nos tornemos em máquinas for verdade, essa poluição não nos fará grande mal. As máquinas não respiram, portanto não têm grandes problemas nesse aspeto. Pelo contrário, para as máquinas algo verdadeiramente hostil se trata da água, que enferruja seus metais - para nós seres biológicos, pelo contrário, a água se mostra essencial.

Mas e se o homem deixar de ser biológico e passar a máquina? Fico algo desesperado, isso sim, quando vejo seres supostamente inteligentes se comportando de forma estúpida. Pessoas que não conseguem ver mais adiante porque lhes falta imaginação. Pois que se possuíssem imaginação, não enviariam uma nave para o espaço com música e livros relacionados com a natureza humana para o espaço, na esperança de que algum extra-terrestre a encontrasse.

Porque se tivessem imaginação logo compreenderiam que se esses extra-terrestres evoluíram de forma completamente diferente da nossa, possivelmente terão à sua disposição outro tipo de sentidos e talvez não sejam capazes sequer de sentir essas coisas que a natureza humana sente. Tente explicar filosofia para uma mosca - ela não entende, porque seus sentidos não foram feitos para compreender a natureza humana, da mesma forma que os seres humanos não entendem porque a mosca come merda.

Como Robert Anton Wilson explica em seu Gatilho Cósmico, talvez mesmo aqui, em nosso planeta, existam "aliens". Seres que não consigamos sentir com nossos sentidos normais. E talvez eles também não saibam de nossa "existência" porque seu sistema perpecional "é"diferente do nosso. Porque a realidade em que vivem se trata de outra. Se isso não se pode chamar de prisão, o que pode?

Agora para minhas alegações finais: partindo do princípio de que através da consciência desenvolvemos a individualidade e isso nos levou a virar as costas uns aos outros, a matar incessantemente, a destruir, a natureza nos voltou a colocar no caminho devido, através da internet. E disso proliferam palavras positivas como "partilha". Uma vez que parecemos ter perdido ou nos tornado biologicamente ignorantes da ligação existente na nossa espécie, de que todos partimos da mesma fonte, de que todos somos partes da mesma máquina, a internet nos veio lembrar que não estamos sós. Que somos irmãos.

E então, todos os dias pessoas trabalham para que tenhamos sistemas cada vez mais avançados de tradução linguística que em vinte, quarenta ou sessenta anos tornarão as linguagens obsoletas. Se as linguagens se tornarem obsoletas e todos se compreenderem, as nações entrarão em colapso. E isso nos levará ao inevitável destino que muitos temem sem razão: a Nova Ordem Mundial. Exceto que se trata de uma coisa boa. Um mundo onde todo o mundo se compreende, se escuta. O mundo pelo qual tenho esperado. O mundo como devia "ser".


Monday 21 March 2011

A Prisão de Ferro? #1













"Em Civilização e Seus Descontentamentos, Sigmund Freud sugere que o homem criou uma civilização que acabou por se tornar uma prisão; ela exige que ele constantemente reprima desejos que são naturais aos animais selvagens."

Thursday 17 March 2011

The Buddha is in the park




















Se torna difícil, após e durante a leitura de VALIS, descrever de que o livro se trata. Ficção científica ou especulativa? Tratado filosófico? Talvez ambos?

Seja como for, quando o terminei de ler, houve algo que tive de imediato a certeza - que estava na presença de um grande livro.

VALIS, para começar, se trata do primeiro livro em que vejo o conflito de personalidade do autor espelhado no texto. Com alguns de vocês já devem saber, o personagem principal, de seu nome Horselover Fat, se trata de uma espécie de tradução do nome do autor, Philip K. Dick.

Isso porque muitas das coisas presentes no livro terão acontecido com Dick, entre a "realidade" e a "alucinação". Esse conflito de personalidade começa logo no início do livro e até cerca da página cinquenta, Dick vai se referindo a Horselover Fat ora na primeira pessoa, ora na terceira. Isso porque talvez fosse para ele difícil separar Horselover Fat de si próprio, o que quer que isso seja.

Para quem já leu alguns livros de Robert Anton Wilson e Grant Morrison, VALIS se caracteriza por um autêntico orgasmo de sincronicidades. Como o Synthzoid já mencionou aqui nesse post, começamos (alguns de nós) por ter sintomas de apofenia, algo que Philip K. Dick já devia conhecer bem.

Alguns exemplos disso são, na conversa de Horselover Fat com Dr. Stone, o fato de Fat dizer que as origens da humanidade se encontram perto da estrela Sirius. Já em Gatilho Cósmico, Robert Anton Wilson havia referido a mesma coisa, com base no livro de Robert K. G. Temple "O Mistério de Sirius". Fat refere também a tribo Dogon do Mali como origem do cristianismo, uma vez que eles usam o símbolo do peixe (o Vesica Piscis) etc. Uff. Tem sincronicidade demais. Se eu fosse referir todas a que o livro me leva, estaria aqui séculos.

Mas posso dar como exemplo - e porque também tenho minha dose de apofenia - que Sirius se encontra na constelação Canis Major ou O Grande Cão. Daí lembro que o cão se trata talvez do único animal a ter uma relação especial com o ser humano e que a palavra "cão" em inglês se traduz para "dog" e se lida ao contrário... vira "god". Os mais afetados chegam a pensar que os cães são extra-terrestres enviados para ajudar os humanos, nossos vizinhos num planeta perto de Sirius. Eu, por motivos de sanidade mental, não irei tão longe. Sincronicidade é foda.

Voltando a VALIS, Horselover Fat apresenta uma série de teorias em grande consonância com Os Invisíveis e capazes de deixar qualquer um, como diria, entre o confuso e a sensação de que ele fala de qualquer coisa que parece fazer sentido.

Em primeiro lugar, imagine nosso universo como um computador. Esse computador tem um vírus e o vírus se chama irracionalidade. Numa tentativa de corrigir esse universo, VALIS injeta no universo o "logos", um ser de pura informação e como tal racional, que assume uma simbiose com um ser humano - nesse caso o ser humano se tratou de Jesus Cristo. O "Logos", conhecemo-lo vulgarmente por outros nomes, como o Espírito Santo.

VALIS: "an informational anti-toxin"

Essa percepção de Fat do nosso universo como irracional me assalta todos os dias como contendo uma verdade assombrosa. Só assim se explica que aqueles que se dizem "crentes" em Jesus Cristo não liguem porra nenhuma aos seus ensinamentos morais mas façam antes exatamente o contrário de tudo aquilo que ele tentava ensinar. Só assim se explica que assassinemos Ghandi, Cristo e John Lennon e se venere Bush, Khadafi e Hitler. Que há algo de irracional nesse universo me parece coisa certa. Por assim dizer, Cristo se carateriza como um antivírus contra a irracionalidade.

«The Empire never ended»

Mas continuando: segundo Fat, após a morte de Cristo, o "plasmate" (o Logos) escapou do "Império" e se refugiou em Nag Hammadi até 1974 de onde terá saído para destronar o representante do "Império" Richard Nixon, com o escândalo Watergate. Também de acordo com Fat, o tempo só recomeçou em 1974.

A queda do Império Romano também se encontra referenciada nessa série de vídeos de Terence Mckenna. Mais sincronicidade e apofenia.

Acho essa noção do Logos como um ser de pura informação que terá saído de Nag Hammadi "angry as a mother fucker" muito curiosa. Pois acontece que dois anos depois, em 76, Steve Jobs funda a Apple e hoje, em 2011, não podíamos estar mais num mundo de pura informação que esse. E um mundo onde há mais informação, pode dizer-se, trata-se de um mundo mais racional. Será coincidência apenas que a internet tenha ajudado a despoletar revoluções no Egito, Tunísia e Líbia; que o Wikileaks esteja tendo um papel essencial na divulgação de crimes governamentais? Talvez a loucura de Dick e Horselover Fat fosse antes uma "super-sanidade".

VALIS dava matéria para dezenas de posts, talvez dê ainda. Mas nesse momento em que escrevo o post não consigo retirar na cabeça as fantásticas teorias de Fat, que quase tornam o cristianismo uma religião interessante. Penso que à semelhança de Fat, que vive nesse túnel de realidade em que tudo isso parece fazer sentido, também outras realidades existem neste mundo, na cabeça de cada um.

Já vivi num túnel de realidade paranóico, pessimista, crente que existiam uns Illuminatti que tinham um plano secreto para dominar o mundo e instalar uma "Nova Ordem Mundial". Alguns de vós poderão mesmo viver parcialmente nesse túnel, mas tenho de dizer, prefiro esse em que hoje vivo.

Ele se descreve assim: satírico, otimista, com a consciência de que todas as realidades devem se entender como relativas e nunca absolutas. Que a morte deve ser entendida como inevitável parte da natureza e não a devemos julgar pela informação que dela obtemos por nossos sentidos. Tenho, sobretudo, esperança na humanidade. Como McKenna, como Morrison, como Dick. Esperança na abolição do sofrimento e no derrube desses mundos que chamamos de nações e que nos unamos de novo como irmãos que somos e sempre fomos, do mesmo passado para o mesmo futuro. A internet veio para nos unir, e desta vez o Império não nos conseguirá separar.

O Buda está aqui, e desta vez, somos muitos.